Tempestade *


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A paisagem era de um contraste majestoso.
De um lado, o azul translúcido, glorioso;
de outro, montanhas plenas de sinuosidade
apontando longos dedos para o céu de claridade.

Num repente, com um quê de misterioso
que se alçava, empolava, crescia abominoso,
o escuro bojava com sinistra lentidão
enegrando a abóboda celeste com determinação.

O vento amainou, cessando de todo.
Como a ligação de um diodo
ecoou, no silêncio, um ronco longínquo
fazendo baixar o nevoeiro ameaçador, propínquo.

Tudo escureceu de momento, como por imposição,
numa espera que, de horas, teria a duração.
Inquieta a natureza foi tomada de ansiedade
tornando-se ofegante perante aquela realidade.

Baforadas sopravam em intervalos intermitentes
arrebatadas no turbilhão de lufadas efervescentes.
Folhas mortas rolavam revolvidas
em tufos de galhos e capim envolvidas.

A escuridão tornou-se intensa, o calor atroz.
Envolvia animais parados, apáticos, sem voz
que se chegavam aos homens à busca de proteção,
como se estes representassem a salvação.

Uma risca de fogo acendeu o horizonte
cortando-o e tornando-o bifronte.
Foi o sinal. Em segundos de pasmo
um clarão medonho iluminou o marasmo.

A conflagração dos elementos fez-se presente.
Furiosa ventania desencadeou-se, repentinamente,
abrindo nos céus grandes cataratas
com relâmpagos e estampidos em triplicatas.

Abrigos ruiram, madeiras e vigas retorcidas,
raízes ao longe e de sua terra sacudidas
pela possante e feroz mão do vendaval.
Absolutamente tudo sucumbiu ao temporal.

Córregos, outrora ressecados valos,
intumesciam rugindo em furiosos estalos;
transbordavam inundando campo e pasto
em desordem, levando troncos de arrasto.

Relâmpagos uns nos outros se despedaçavam
em milhares de fagulhas se desmanchavam,
como luzes enlouquecidas de colorido neon
movimentadas por um poderoso ciclotron.

Assim passou toda a madrugada.
Quando luziu o dia a natureza aniquilada
ferida, esmagada, revolta, com estupefação
presenciava, atônita, o final de tal convulsão.

Giulia Dummont

* Adaptação de texto homônimo, em prosa, do Visconde de Taunay.

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